“Todos veem o que você parece ser, mas poucos sabem o que você realmente é.”
A expressão “maquiavélico” costuma ser associada a características como astúcia, ardilosidade e ausência de escrúpulos. Contudo, essa interpretação revela uma compreensão superficial e parcial do pensamento de Nicolau Maquiavel. O filósofo florentino, inserido no contexto do Renascimento cultural, buscava resgatar e valorizar os clássicos da Antiguidade Grega, trazendo uma perspectiva inovadora sobre a política e o poder. Em sua obra mais emblemática, O Príncipe, Maquiavel nos provoca com uma reflexão incisiva: “Se os homens fossem bons, tudo o que eu digo seria mau.” Por meio dessa afirmação, ele inaugura uma abordagem inovadora para sua época, ao distinguir a virtude do bem comum da política do poder.
O conceito de engano, segundo Maquiavel, transcende a mera falsificação ou o ato deliberado de iludir; ele é, sobretudo, uma expectativa construída tanto pelos governantes quanto pelos governados. Vivemos envoltos em crenças, normas, valores, desejos e pactos que nos direcionam para caminhos pautados por sonhos e aspirações que, muitas vezes, nos escapam à percepção. Criar expectativas no outro pode ser um equívoco desastroso, pois dificilmente serão plenamente compreendidas ou correspondidas. A consciência sobre como nos posicionamos diante dessas situações é fundamental, assemelhando-se a um jogo de xadrez, em que, a cada movimento, somos desafiados pela imprevisibilidade do adversário. Assim, conhecer as regras torna-se essencial para evitar surpresas indesejadas.
Não se pode afirmar que esse “jogo” político tenha sido criado individualmente por alguém; Ele é inerente às relações sociais e ao exercício do poder. Assim como na política, frequentemente tentamos nos desvincular desse cenário complexo, mas tal atitude revela um equívoco perigoso. A desordem política, quando presente, é também nossa responsabilidade enquanto cidadãos. A ausência ou a omissão no campo político configura uma forma dissimulada de afastamento dos acontecimentos que moldam a sociedade, pois, enquanto parte integrante do corpo social, devemos reconhecer nosso papel e nossa relevância. É preciso evitar que disputas mesquinhas pelo poder nos levem a negligenciar a importância do engajamento cívico.
A busca pela glória e pelo poder faz parte da natureza humana, mas é imperativo que saibamos lidar com essa tendência com prudência. Maquiavel adverte que a má reputação é praticamente irrecuperável, ressaltando que o governante moderno deve pautar suas ações pela eficiência, pois, em última instância, é por elas que será julgado pelo povo. Portanto, compreender a complexidade das relações políticas e as nuances do poder é fundamental para uma atuação ética e consciente.
Antonio Porfirio de Matos Neto
Graduações em Filosofia, Economia, Ciências Políticas e Ciências Jurídicas.