Mas a produção da espécie poderia ter crescido muito mais, em 2023, não fosse alguns problemas sanitários, responsáveis pela redução da produção de alevinos e aumento da mortalidade no campo, principalmente no cultivo em tanques-rede, informa o presidente da PeixeBR, Francisco Medeiros. Centro-Oeste Farm News continua repercutindo o Anuário PeixeBR 2024, publicado na semana passada.
Redação*
O quadro ao lado, elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), foi elaborado em 2016, se tornou conhecido em todo o mundo e é utilizado frequentemente para mostrar o crescimento da produção de proteínas animais globalmente.

Os dados constantes nele, conforme o Anuário PeixeBR 2024 da Piscicultura, continuam atuais. O grande destaque são os peixes de cultivo (retratados no item peixes de aquacultura), que naquele momento superava a produção de carne bovina. Ele também mostra que há duas décadas o mundo produzia 40 milhões de toneladas de peixes de cultivo e que agora, em 2024, está chegando a 100 milhões de toneladas por ano. Um salto fantástico de duas vezes e meia em 20 anos. Em termos globais, a piscicultura é a atividade animal que mais cresce. E já faz tempo. Mesmo com algum atraso, esse cenário de desenvolvimento da piscicultura chegou ao Brasil. Até o final do século XX, a atividade era de certa forma artesanal, sem organização – salvo poucas exceções – e, o mais grave, sem muito respeito dos consumidores, que preferiam os peixes importados em detrimento do nacional. Como argumento adicional para não levar para casa os peixes cultivados, a população falava em gosto de barro e insegurança em relação à procedência. Pouco mais de uma década para cá esse cenário vem mudando rapidamente. Os peixes de cultivo, liderados pela tilápia mas com a essencial contribuição dos nativos – como tambaqui e seus híbridos –, tornaram-se cada vez mais presentes na alimentação dos brasileiros. Acontece no Brasil, como ocorreu mais cedo em outros importantes mercados, o fortalecimento da cadeia da produção de peixes de cultivo. O crescimento da produção e da demanda de tilápia, por exemplo, é fantástico. Tomando como referência a última década (2014 a 2023), período em que a Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR) atua no fomento, valorização e defesa da produção nacional, a oferta de peixes de cultivo cresceu 53%, saindo de 579 mil toneladas (2014) para 887 mil toneladas (2023). No mesmo período, a tilápia mais que dobrou de produção (passou de 285 mil toneladas para 579 mil toneladas: +103,2%) e cresceu consistentes 93,2% em consumo. No mesmo período, as demais proteínas cresceram – exceto a carne bovina –, porém bem menos que a tilápia.
Em termos de produção, as que mais avançaram foram a carne suína (+48,6%) e os ovos (+55,9%). Vários fatores contribuem para o crescimento da tilápia no mercado brasileiro. Em primeiro lugar, é indiscutível a perfeita adaptação da espécie às condições brasileiras. Esse encaixe foi tão perfeito que o produto nacional é considerado um dos melhores do mundo em termos de sabor, suculência e saudabilidade e, em decorrência disso, começa a ganhar espaço em mercados internacionais de produtos premium, como os Estados Unidos. O Brasil tem terras, água, clima propício e a indiscutível competência dos produtores, que trabalham com extremo profissionalismo e se tornaram os grandes responsáveis pela liderança da tilápia em praticamente todas as regiões do país. Aliás, devido a esse desempenho, o Brasil se tornou o quarto maior produtor de tilápia do mundo, com pretensão de ganhar mais posições no ranking nos próximos anos. Em 2022, o Instituto Axxus realizou pesquisa para entender qual a percepção dos brasileiros em relação à tilápia. O resultado mostrou que 7 em cada 10 pessoas consultadas apreciam esse peixe. Por tudo isso, a tilápia conquista os consumidores e mantém consistente ritmo de crescimento da produção. Em 2023, mesmo em um ano com desafios climáticos e sanitários, a oferta aumentou 5,28%. A consequência é o aumento do consumo interno. Em 2014, o brasileiro consumia 1.47 kg de tilápia por ano. Em 2023, o consumo per capita atingiu 2.84 kg. Esse salto é consistente, mas o potencial para o contínuo crescimento é indiscutível. Em nível mundial, o consumo médio per capita de peixes é de 20 kg/hab/ ano. No Brasil, a demanda por pessoa é de 10 kg. Os peixes de cultivo como um todo (tilápia, nativos e outras espécies) representam 4.35 kg/hab/ano. Ano após ano, os consumidores apreciam cada vez mais a tilápia, contribuindo para colocar o Brasil na posição que merece no mercado mundial de produção.
Exportações
Segundo dados levantados por Manoel Xavier Pedroza Filho e Hainnan Souza Rocha, da Embrapa Pesca e Aquicultura, em artigo para o Anuário PeixeBR 2024, as exportações da piscicultura brasileira aumentaram 4% em valor, em 2023, totalizando U$S 24,7 milhões.
Em toneladas – eles informam, a partir de dados do COMEXSTAT, do Ministério da Economia – houve queda de 20% (6.815 toneladas).
Os dois técnicos informam ainda que o mercado interno teve influência direta no menor crescimento das exportações.
– A demanda por tilápia no mercado interno continuou aquecida, tornando a exportação menos atrativa devido aos preços elevados praticados no mercado brasileiro. Entre o terceiro trimestre de 2021 (início da coleta de dados pelo CEPEA/USP) até o último trimestre de 2023 o preço médio da tilápia no mercado interno aumentou 33,47%, passando de R$ 7,29/kg para R$ 9,73/kg. No mesmo período, o preço médio da tilápia inteira exportada aumentou apenas 7,33%, passando de US$ 2,18/kg para US$ 2,34/kg – apontam.
Como se vê, nestas e em outras informações do Anuário PeixeBR 2024, em meio a muitos desafios, a piscicultura brasileira obteve muitas conquistas em 2023.
Influência do MPA
Em editorial para o Anuário, o presidente da PeixeBR, Francisco Medeiros lembra que o ano passado começou com a recriação do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), “em um momento em que a piscicultura convivia com uma das melhores taxas de crescimento anual de sua história. O modelo enfrentava dificuldades, mas crescia a taxas robustas.”
Conforme Medeiros, o MPA levou a atividade a subir a régua das expectativas positivas.
– O ano foi marcado pela aproximação com essa nova estrutura de governo – disse.
Ainda no seu balanço do ano passado para a piscicultura brasileira, Francisco Medeiros faz uma análise sobre as principais espécies de peixes nativos, “uma das promessas da piscicultura nacional”. Conforme ele, esta categoria enfrentou, em 2023, os mesmos problemas dos anos anteriores:
– Baixo nível de industrialização e ainda nível indesejado de comercialização irregular, mas com uma vontade imensurável dos produtores e empresários em fazer acontecer. Afinal, o mercado gosta do produto. Um exemplo é o prêmio da costelinha de tambaqui na Seafood Expo North America, em Boston – aponta Medeiros
Já a tilápia – continua o presidente -, cresceu.
– Mas pouco em comparação aos últimos nove anos. Isso se deveu, basicamente, a problemas sanitários, responsáveis pela redução da produção de alevinos e aumento da mortalidade no campo, principalmente no cultivo em tanques-rede. Mas o setor reagiu e novas unidades de produção, com sistemas mais rigorosos de biossegurança, além de programas de vacinação mais robustos, proporcionaram já no último trimestre do ano passado uma oferta regular de alevinos – disse.
Ainda segundo o executivo, os juvenis, porém, essenciais para quem produz em tanques-rede, não atenderam à demanda.
– O mercado interno não se importou com a oscilação da oferta e manteve-se aquecido o ano todo, o que impactou diretamente as exportações com taxa reduzida de crescimento (4%) quando comparada aos anos anteriores. Aliás, levantamento exclusivo da PeixeBR mostra que a tilápia é a proteína animal cujo consumo mais cresceu na última década, passando de 1.47 kg/hab/ano para 2.84 kg/hab/ano. Crescimento de 93%.
Francisco Medeiros reporta, também, que os preços de insumos para ração foram mais amigáveis do que em 2022, o que contribuiu para melhor gestão dos custos de produção.
– Os principais projetos de expansão da piscicultura, principalmente de tilápia, continuaram, principalmente nos estados do Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, São Paulo e Minas Gerais. Juntos, eles representam o grande grupo de produção de tilápia no Brasil. Nada mais natural – afinal, estão próximos dos insumos e do consumo.
Por fim, Medeiros recorda com “terminamos 2023 com novos regulamentos do Ministério da Pesca e Aquicultura e do Ibama que podem impactar a produção em 2024, além – é claro – da chegada de um contêiner de filé de tilápia do Vietnã. Foi um dezembro cheio de preocupação.
*Com textos da PeixeBR, editados pela Redação de Cofarmnews